O que há por detrás dessa confusão, dessa desordem e desse sofrimento que nós, seres humanos, temos em nossas vidas? Me parece que, para a maioria de nós, ainda não ficou claro que tudo isso nasce dentro de cada um de nós. É alguma condição interna em nós que torna isso viável dentro da vida.
Em geral, nós estamos sempre culpando os outros, culpando o externo, culpando o lado de fora. Então, me parece que ainda não está muito claro isso, que todo o problema reside dentro de cada um de nós. E a pergunta é: onde é que isso se encontra? Não é o mundo, externamente, que está criando problema para nós, nós é que, na verdade, estamos criando problemas para o mundo. Em que nível isso acontece?
Então, vamos tornar claro isso aqui para você, que o único problema presente em nossas vidas é interno, e isso se reflete em nosso mundo externo, em nosso mundo de relações com as pessoas, com as situações. Onde é que isso ocorre? A nível da mente. É isso que ainda não está claro.
O que é essa mente? O que é a mente humana? Como ela funciona? A não compreensão de como nós funcionamos faz com que essa condição de vida e de existência continue dessa forma: confusão, desordem, sofrimento. Então nós passamos uma boa parte da vida sem atentar para isso, e é possível que a grande maioria carregue a vida inteira dentro dessa condição, como geralmente acontece.
Então, é necessário nos atentarmos para aquilo que se passa dentro de cada um de nós. Assim, se torna essencial, imprescindível a compreensão da verdade sobre quem nós somos, de como a mente funciona. Então a pergunta é: o que é a mente? Uma outra coisa é: o que essa consciência em nós?
Vamos colocar para você aqui esses dois assuntos. O que é a mente – o que é a mente humana, como ela funciona – e o que é esta consciência? Nós falamos da consciência e falamos da mente, e nós, geralmente, separamos isso. Há realmente uma separação? Uma outra coisa: qual é o elemento principal da mente?
Qual é o elemento principal dessa, assim chamada, “consciência”? O elemento principal pode ser observado, o elemento principal de tudo isso é muito claro. Claramente é possível observarmos que o elemento principal ainda é o movimento do pensamento. O movimento do pensamento é o elemento principal dessa, assim chamada, “mente em nós” e dessa, assim chamada, “consciência em nós”.
Então, o que é o pensamento? Como ele funciona? Pensamento em nós é algo muito simples de ser observado; ele é a memória em nós. Observe isso que estamos colocando para você. Todo o pensamento em você é só uma lembrança, é só uma recordação, esse pensamento é só uma memória. Sem memória, não há pensamento. A base, então, do pensamento são as lembranças. Tudo aquilo pelo qual você passou, hoje você se recorda aqui, nesse instante. Então, o pensamento, que é memória, que é essa lembrança, é a base da mente. Essa mente é o próprio movimento dessa consciência como nós a chamamos, como nós a conhecemos.
Então, o que é essa consciência? É a mente, é o movimento da mente, que é pensamento, que é memória. Percebam uma coisa aqui muito importante: todas as nossas ações – esses comportamentos em nós – estão presentes em razão do pensamento. Nós não compreendemos como funciona esse movimento do pensamento, que é memória dentro de cada um de nós. Nós somos impulsionados para a ação, para o comportamento com base no pensamento, com base na emoção, no sentimento e nesse formato de percepção. Tudo isso está dentro do modelo do pensamento, desse movimento que é memória dentro de cada um de nós.
Assim, de onde nasce nossa confusão, nossa desordem e o nosso sofrimento? Da consciência. Dessa consciência presente que nós temos, dessa mente presente nessa consciência. E essa mente é esse movimento de pensamento. Então, a não compreensão dessa memória é a continuidade da confusão, é a continuidade da desordem e do sofrimento.
Nós queremos ter paz em nossa vida, nós queremos ter paz em nossas relações, nós queremos nos compreender uns aos outros, mas isso não se torna possível enquanto o elemento principal em nós for esse elemento que é o elemento do pensamento. Aqui eu me refiro ao pensamento que se assenta na memória, que se assenta nessa estrutura de recordação e de lembrança. E por que é assim? Por que a Paz não é possível? Por que a Liberdade, por que o Amor não são possíveis dentro dessa condição? Porque nós estamos sempre impondo a esse modelo de memória, de lembrança um elemento que se separa dessa lembrança, dessa memória, desse pensamento, que é o elemento “eu”. Vamos investigar isso aqui com você.
O “meu pensamento”, que acredito ser meu pensamento, é uma memória que surge nesse instante em razão de uma recordação. Por detrás dessa recordação existe um elemento, que é o elemento “eu”. Esse sentido de um “eu” presente dentro do pensamento é um elemento que se separa do pensamento para avaliar esse pensamento; se separa dessa memória para avaliar essa memória, para julgar essa memória, para comparar essa memória com alguma outra coisa. Assim, quando fazemos isso, estamos criando um elemento de conflito dentro do pensamento, dentro da recordação, dentro da memória. Esse elemento do conflito é o “eu”.
Quando olho para você e falo com você, aquilo que está presente é esse elemento “eu” e, com base nesse pensamento – tirando conclusões, avaliações e julgamentos –, está dizendo coisas para você. Então, o que nós temos nesse encontro entre “eu” e “você”? Um encontro entre memórias, entre lembranças, entre pensamentos que estão em conflito, porque você faz uma ideia sobre quem eu sou e eu faço uma ideia sobre quem você é. Quando nós julgamos um pensamento, uma lembrança e uma memória, nós estamos fazendo isso.
Não somos capazes de lidar com o outro com base na memória. A memória, a lembrança, o pensamento são algo que vêm do passado. Nesse contato com você, já está presente um preconceito, um conceito pré-formado. Esses são os encontros entre as ideias que as pessoas têm. Reparem que as pessoas têm opiniões, têm ideias, têm conclusões uma a respeito das outras. Isso é conceito, isso é preconceito. Essa é uma visão particular do “eu”, do ego, e isso naturalmente é conflito.
Então, não é possível Paz em nossas relações enquanto as nossas relações tiverem se assentando nesse padrão de lembrança, de memória, de recordação que têm por detrás disso esse elemento que é o “eu”, o ego. Nós precisamos, sim, da memória, da lembrança, mas num nível funcional. O seu nome é uma lembrança que eu tenho de você, o meu nome é uma lembrança que você tem de mim. A imagem do rosto, a recordação dessa, assim chamada, “pessoa” é algo funcional. Nós precisamos disso em nossas relações para nos reconhecermos, para trabalharmos juntos, para nos relacionarmos. Mas, psicologicamente, nós estamos colocando um elemento novo, que é o elemento “eu”, o ego, nesse contato.
Então, esse sentido de “alguém” presente aqui e “alguém” presente aí, esse olhar a partir de crenças, de conceitos, de preconceitos, de opiniões, de ideias divergentes, tudo isso nasce desse fundo de memória e, por detrás desse fundo de memória, nós temos esse elemento que é elemento “eu”, o ego, esse que está trabalhando apenas com uma imagem, com um conceito, com uma visão particular sobre quem você é.
Então, eu tenho uma visão particular de quem eu sou e tenho uma visão particular sobre quem você é baseado em opiniões, em crenças, em conceitos, em preconceitos. Então há confusão. Não pode haver Amor enquanto presente estiver essa forma de imagem. Então, não existe Amor em nossas relações enquanto prevalecer essa condição psicológica de identidade, que é a identidade do “eu”, do ego.
Portanto, olhar para esse movimento, que é o movimento do “eu”, do ego, dessa “pessoa” que acredito ser nessa relação com você, como eu acredito que você é, tomar ciência desse movimento de separação, de divisão é o fim para isso. Olhar para esse movimento do ego presente, olhar para esse movimento do “eu” presente, se despir desse movimento e ficar apenas com a memória, a lembrança, a recordação funcional.
Precisamos de um dado conhecimento, de uma dada experiência, de uma relação de reconhecimento entre eu e você, sem o elemento do ego, desse “mim” – que é essa condição psicológica egocentrada de ser alguém dentro da experiência. O problema com esse elemento – que é o “eu”, o ego – é que ele é autointeresseiro. Ele está sempre na busca da relação com o “outro” para os seus próprios fins, para adquirir algo, para ganhar algo, porque ele se vê como uma entidade separada que precisa de coisas. Ele precisa de apreciação, ele precisa de preenchimento.
A questão é que esse elemento, que é o “eu”, está nessa relação dentro de um sentido de separação, de exclusivismo, de autocentramento, autointeressado nele mesmo. Tudo o que ele quer em uma relação é obter algo para si próprio. Então, esse movimento é o movimento do egoísmo, do egocentrismo. Então, a divisão é a causa dessa desordem, dessa confusão, desse sofrimento.
Não compreendemos como a mente funciona porque nós particularizamos esse movimento, tornamos esse movimento algo particular desse “eu”, desse centro, dessa pessoa. Ao olhar diretamente para esse movimento da mente, como ela funciona, podemos nos libertar dessa ilusão, da ilusão de uma identidade presente dentro dessa experiência. É quando a mente, então, se torna livre. Então, a compreensão de como a mente funciona é possível quando você se aproxima e observa o movimento dela e percebe esse elemento que é o “eu”, o ego, esse autocentramento.
Quando você começa a se tornar ciente de que você está constantemente construindo do outro uma imagem, uma ideia, um conceito, uma opinião, quando você começa a se tornar ciente de que você está fazendo isso para adquirir algo, conseguir algo, obter algo do outro, você começa a perceber esse movimento do ego, desse centro, dessa ilusão, desse sentido de um “eu” presente, sempre carente, necessitado e, portanto, egocêntrico. Tomar ciência do próprio movimento do “eu” é Autoconhecimento, é a Verdade do Autoconhecimento.
Então, essa aproximação desse olhar para si mesmo e observar o movimento da memória e esse sentido de um “eu” presente se separando para construir uma história pessoal, particular dentro dessa relação com o outro, com a vida, com o mundo é Autoconhecimento.
Quando há uma Real Compreensão disso, existe o fim para o sofrimento, porque você está soltando essa ilusão, a ilusão desse “mim”, desse “eu”, desse ego dentro dessa experiência – e aqui a experiência é o pensamento, a memória, a lembrança. Então nos tornamos capazes de uma vida em relação com o outro sem qualquer imagem dele ou dela, sem qualquer opinião, conceito, preconceito a respeito dele ou dela. Uma vida livre de imagens de quem é o outro, do que o outro representa para esse “mim” é uma vida em Amor, é uma vida em Paz, em Liberdade, é quando não há mais espaço para a desordem, para a confusão e para o sofrimento.
Assim, olhar para esse movimento da mente, de como ela funciona, se tornar ciente desse elemento que é o “eu”, que se separa do pensamento sendo esse o pensador, se separa da experiência sendo esse o experimentador, que se separa do outro sendo esse o “eu” e o “outro”, “ele” ou “ela”, tomar ciência desse movimento de separação, de dualidade.
Nossa vida está assentada nesse sentido de um “eu”, de um ego nessa dualidade, nesse sentido de separação, nesse senso de “eu e o outro”, “eu e ele”, “eu e os meus pensamentos”, “eu e as minhas ideias”, “eu e as minhas crenças”. Nós aqui estamos olhando juntos para essa Verdade de que a única Realidade presente é a Realidade Divina, é a Realidade desse Ser que somos quando não existe esse elemento, que é o elemento do “eu” – eu tenho chamado de pessoa, ego, identidade egoica.