Ao perceber que tudo é rotina, ao perceber que tudo termina em tédio e em alguma forma de insatisfação, o ser humano está à procura de algo. Há duas vertentes aí: a primeira são aqueles que procuram esse “algo” em coisas… em coisas, em lugares, em objetos, em pessoas; são os que têm uma inclinação não religiosa. E existem aqueles que estão à procura desse “algo” na religiosidade. Algo sendo buscado no mundo e algo sendo buscado fora do mundo.
Alguns de vocês já ouviram falar e, hoje em dia, está muito badalado isso. É a questão dessa linha filosófica que procura se aproximar desse encontro com algo fora desse contexto de rotina, desse contexto comum, desse contexto de repetição. Eles apontam a possibilidade de viver feliz aprendendo a lidar com o mundo: como reagimos ao mundo é algo que depende da qualidade dos nossos pensamentos, das nossas ideias, das nossas crenças, e é como reagimos ao mundo, às situações na vida, a forma como reagimos a isso, dependendo dessa qualidade de pensamento que trazemos, que irá determinar se seremos felizes ou não. Isso é chamado de estoicismo – a procura da felicidade dentro de um princípio filosófico.
Então, para o filósofo, o encontro com uma certa qualidade de vida, de harmonia de vida, de paz, de felicidade… Eu não sei bem o que se entende por felicidade dentro desse contexto, mas é algo parecido com uma espécie de ajustamento psicológico, mental, a essa condição que se apresenta. A isso nós chamamos de felicidade: um mero ajuste a determinada situação, dependendo da qualidade de pensamento que tenhamos. Isso é chamado de estoicismo, e as pessoas, hoje em dia, estão fissuradas nisso, estão loucas por isso!
Então, esse é um caminho para a felicidade dentro desse princípio, dessa busca de algo ainda no mundo. Somado a isso, nós temos a psicologia, que também vai por um caminho dizendo a você que é possível você alcançar essa paz, ou essa felicidade, ou essa “coisa”, esse “algo”, ainda mudando os seus pensamentos.
Então, dentro da psicologia, temos diversas outras vertentes. Tem, por exemplo, a psicologia positiva, que fala do “Estado de Flow” como um estado em que a mente e o corpo estão em sintonia, em harmonia, em não conflito, em não contradição com a vida como ela se mostra. Então, vamos, através de uma disciplina psicológica, através de uma técnica psicológica, alcançar… vamos alcançar isso, vamos trabalhar para alcançarmos essa condição desse assim chamado – dentro da psicologia positiva – “Estado de Flow”.
Então, é a procura de algo fora da rotina, do comum, do estresse, dessa dor que o ser humano vem enfrentando, vem vivendo há milênios, por esse caminho. Então, é a procura por algo ainda no mundo, no mundo dos objetos, nos lugares, nas pessoas, nas realizações ou nas frustrações.
A realização dentro desse desafio no mundo, tendo essa aproximação dessa procura por algo fora dessa condição pela psicologia ou pela filosofia – essa é uma vertente. A outra vertente é a busca religiosa. Então, existem aqueles que estão na procura por algo já não no mundo, mas fora do mundo – é a procura religiosa. E a procura religiosa é se ligar a uma determinada religião oficializada. Você passa um período ali para ver se você encontra essa outra coisa procurada, buscada por você, que, dentro da religião, é chamada de Verdade ou Deus. Ninguém sabe o que é Isso, mas todos usam a expressão. Se imagina algo sobre isso, como na própria filosofia se imagina algo sobre verdade. Na religião, se imagina algo como Deus. É uma ideia, é um conceito, é uma crença. Ninguém sabe o que isso significa, o que isso, de verdade, representa.
Mas, no Google, a palavra mais badalada, que é a mais procurada, que é a mais pesquisada, que é a mais estudada, que é a mais conhecida, é a palavra “Deus”. Há uma concorrência muito grande porque todos procuram, todos querem saber e todos pesquisam, e todos ensinam sobre isso. Então, o uso da palavra “Deus”… Então, na religião, existe essa procura. Então, você procura essa coisa chamada “verdade” e “Deus” dentro dessa busca religiosa, e isso não se resolve. Internamente, você continua ainda como uma criatura humana ansiosa, preocupada, estressada, entediada, vivendo num estado de confusão interna, que só você mesmo sabe.
Você tenta compartilhar isso com um profissional da área de saúde mental e ele prescreve alguma medicação, ele prescreve uma nova técnica de terapia, de psicoterapia, ou lhe indica algumas mudanças de comportamento, mas também não se resolve. E aqui estamos nós, o ser humano… todos nós aqui, olhando para isso. Já que não se encontra no mundo, nessa busca por esse algo no mundo, e nem se encontra nessa busca por algo fora do mundo… Essa busca por algo no mundo é o materialismo, é o existencialismo, e há vários nomes para isso. E, na espiritualidade – é assim que é chamada essa busca pela vida religiosa.
E, afinal, o que é que estamos buscando? Essa é a pergunta. O que é que nós estamos buscando? Aqueles que constataram – não aqueles que encontraram, mas aqueles que constataram – o fim para esse dilema, para essa confusão, o fim para esse tédio, para esse estado aborrecido de vida, onde você continua vivendo apesar de todas as conquistas no mundo ou conquistas fora do mundo – ainda continua a situação… Aqueles que encontraram, não; aqueles que constataram, neles mesmos, o fim disso, o fim dessa busca por algo lá ou do outro lado, de um lado do rio ou do outro lado do rio… aqueles que constataram Isso nos dão o seu testemunho.
Nós temos Ramana Maharshi nos dando o seu testemunho, nós temos Eckhart Tolle nos dando seu testemunho, nós temos Krishnamurti nos dando seu testemunho, e nós temos inúmeros outros que constataram o fim para isso, o fim da busca. Como é que essa busca termina? Como essa busca termina? Vocês sabem o que estamos dizendo aqui. Alguns de vocês já casaram mais de duas vezes, três vezes… Então, o homem é um desejo, a mulher é um desejo, mas uma casa também, uma casa muito bonita, sonhada, com a mobília dos sonhos. Isso tudo é um desejo! Todos nós sabemos do que estamos falando aqui.
A gente vive trocando de casa, vive trocando também de marido, vive trocando também de mulher, e a gente vai adquirindo, ao longo dos anos, através de um árduo esforço, uma luta, uma forte luta por essas realizações, por uma autodisciplina muito grande… estudar muito, alguns anos de faculdade, depois um diploma de doutorado, depois pós-doutorado, mestrado… Depois de longo trabalho, longa luta, a gente consegue tudo isso e percebe que continua trocando. Então, vamos enfatizar um pouquinho mais isso aqui para a gente ir adiante com você.
Mas há um fim para isso, há um fim para essa busca daquilo que está fora e também há um fim para essa busca daquilo que acreditamos estar dentro. Então, aqueles da ala dos que estão procurando fora dizem que está fora. Parte desse movimento de como reagir à vida, que ainda é psicológico, ainda está fora. Se é algo que depende desse “mim”, desse “eu”, desse “você”, então a ideia é de que algo está fora, é com algo fora que você tem que lidar. E existem aqueles que dizem que é algo dentro, que você vai encontrar algo dentro, e aí você projeta uma imagem de algo dentro: é o Divino, é o Ser Supremo, é o Eu Superior… Então, existem as sombras e a luz. A luz é o Eu Supremo, é o Eu Superior, é o Deus interno, que a gente vem ouvindo falar desde a infância.
Mas tudo isso ainda é parte de uma ideia, é parte ainda de uma crença. E, aí, depois que você se dedica muitos anos, percebe que a coisa não se resolveu. Desejos e conflitos ainda se mantêm. Você realizou um desejo, mas um outro logo a seguir surge. Você tem um marido, mas passa o marido da outra, mais bonito… isso é uma complicação interna para com a qual você lidar, porque, então, você descobre que não era a falta de um marido; aí, a mente diz que é trocar de marido! E, assim, a gente troca de religião, troca de carro, troca de casa, troca de Deus – é porque a gente acredita primeiro em um, depois acredita no outro, e isso não termina.
E o que os Sábios, os Seres Realizados, têm a nos dizer sobre isso? O que é que está faltando? Será que realmente está faltando algo e por isso existe essa busca? Como essa busca termina? Termina quando a gente encontra ou termina quando a gente constata que esse elemento que busca é o problema? É a falta de alguma coisa no mundo material ou no mundo espiritual? É o que está realmente faltando? É a falta de alguma coisa ou é o excesso de alguma coisa, ou é o excesso de algo?
A Verdade está na constatação daquilo que já está agora aqui, não de algo a ser acrescentado ao que está agora aqui. Não é assunto para o que está fora nem para o que está dentro. A Realidade é a Constatação de que essa ilusão, a ilusão da dualidade, é de fato uma ilusão. Encaramos a dualidade como um fato. Sim, é um fato subjetivo, psicológico, mas não é um fato de Realidade. Vamos esclarecer isso.
Nós estamos lidando com o mundo sendo “alguém”, se vendo como “alguém”, se sentindo “alguém”. Então, há essa insatisfação, há essa incompletude, há esse estado de contradição, de conflito, de sofrimento, que nos impele a buscar… “nos impele a buscar” – nós quem? Esse sentido do “eu” em cada um de nós.
Então, é um fato psicológico esse mundo do lado de fora; isso é um fato psicológico. Não é uma Realidade! Não é uma Realidade, mas é um fato psicológico. Precisamos descobrir, como lidar com isso, com esse fato psicológico. Esse fato psicológico é aquilo que sustenta o sofrimento do ser humano, como eu disse agora há pouco: o tédio, esse sentido de rotina, de repetição, de continuidade, alimentando novas expectativas de um futuro melhor, de uma realização melhor, de uma casa melhor, de um de um desejo melhor, de um desejo que vai completar…
Tudo isso ocorre em razão desse fato psicológico, que é uma fraude do ponto de vista da Realidade. Do ponto de vista da Realidade, não existe isso! O fato é… do ponto de vista da Realidade, o fato é: a Vida é o que Ela é, e Ela está completa quando essa condição subjetiva, quando essa condição de fato psicológico, que é essa condição de dualidade, desaparece. Isso é a Verdade! Não adianta citarmos Jesus, Buda… Temos que descobrir isso por nós mesmos, que é essa ilusão do sentido de “alguém” presente lidando com a vida, que irá sustentar continuamente essa busca por algo sempre do lado de fora, para se ver completo. E isso é impossível, porque é da natureza da dualidade o conflito.
Enquanto houver essa dualidade, haverá conflito; enquanto houver o sentido do “eu”, enquanto houver esse “eu”, haverá o outro para ser desejado, haverá outra coisa para ser buscada, haverá a ideia de Deus, que é só uma crença, uma imagem. Não estamos negando a Realidade de Deus, estamos negando a ideia de Deus. A ideia de Deus é um conceito, uma crença. É como olhar para a carta do baralho e dizer: “Aqui está o rei”. Não, não é o rei! Isso é uma figura, uma imagem, uma representação idealística, não é a realidade. Você pode pegar o baralho e encontrar o rei de ouros, o rei de paus – é isso? –, de copas e de espada, mas ali não está o rei. Você olha para um tabuleiro de xadrez e também encontra o rei. Qual é o rei real? Onde está o rei?
Assim representamos Deus ou a Felicidade: como um ideal. Então, não dá para encontrar a Felicidade nem na psicologia positiva, nem no que é entendido lá por “Estado de Flow”. Minha visão sobre o Estado de Flow é completamente diferente. O Estado de Flow é o Natural Estado de Pura Consciência, onde não há, de fato, separação entre Você e a Realidade, mas não é o estado que vem vai, como é proposto pela psicologia positiva; é o Estado Natural, onde o sentido “eu”, do “mim”, o ego, não está mais presente.
Então, nem pela psicologia positiva, nem pela filosofia dos estoicos, no estoicismo. A Realidade da Felicidade não é uma crença, não é uma ideia, não é um conceito. A gente pode falar mais sobre isso. Isso é algo vivencial quando o sentido de dualidade não está mais presente. E o que é necessário para que isso ocorra? O fim do buscador! O fim do buscador é a rendição, a rendição da ilusão de uma identidade presente – isso é rendido, é entregue. Você se rende, você está de verdade em Suas Mãos, você está entregando, você parou de resistir, parou de lutar.
Então, é muito básico isso, é muito simples compreender que a Vida é Onipotente, a Verdade é Onipotente, o Desconhecido, que alguém chama de Deus… eu chamo de “O Desconhecido”; chamaria de “O Sem Nome” e, às vezes, eu chamo de Deus mesmo, mas é o Mais Poderoso! Então, se a Vida lhe mostra que algo está fora, algo tem que ser entregue, algo tem que ser rendido, algo tem que desistir de continuar… e fica essa compreensão em razão desse Nascimento de uma Nova Mente, dessa Inteligência, que tem como base o Autoconhecimento. Aí fica simples compreendemos o que é rendição. Você vai render, você vai entregar, você vai desistir da ilusão desse “mim”, desse “eu”, desse ego.
Então, quando acaba isso, quando isso desaparece, aí Você, em seu Natural Estado de Ser, de Puro Ser, não está mais procurando, nem fora, nem dentro. Esse é o fim do ego, é o fim do “eu”.
Para que essa rendição ocorra, se faz necessária a visão do Autoconhecimento, e Autoconhecimento não é possível se você não se auto-observa. Não adianta continuar buscando! Essa busca tem que terminar, ou você continuará buscando pelo resto da vida! Isso acontece no materialismo e isso acontece no espiritualismo.
Na espiritualidade, as pessoas buscam para o resto da vida e continuam infelizes, continuam sofrendo, continuam sentindo essa incompletude, porque é a presença do ego nelas. Então, não adianta realizar algo na espiritualidade; também não adianta realizar algo no materialismo.
Então, não funciona! Não funciona! Enquanto houver o sentido de separação, seja na espiritualidade, seja na psicologia positiva, seja no estoicismo… enquanto houver o sentido de separação, a ilusão do “eu” estará presente, e a falácia, a mentira, de que algo o fará feliz. Nada o fará feliz! A presença desse “mim” é a ausência da Felicidade. Não adianta você ouvir isso, é necessário olhar, observar, se tornar cônscio disso agora, aqui. Isso é real rendição, isso é a real entrega desse “mim”, desse “eu”, desse ego. OK? É bem isso!