O que tenho notado é que as pessoas têm uma certa dificuldade de acompanhar um texto como esse. Isso ocorre porque nós já temos um padrão, uma fórmula, uma maneira específica de pensar a respeito dos assuntos, e esta maneira é com assertivas de palavras, com assertivas de crenças, com conclusões já preestabelecidas.
Observe, o assunto que tratamos aqui envolve o fim para toda a confusão, toda a desordem, todo o sofrimento humano. Estamos trabalhando com você a Realização do seu Ser, a Realização Divina, a Realização de Deus – alguns chamam isso de o Despertar da Consciência ou o Despertar Espiritual.
Aqui estamos tratando com você do fim para esse centro, que é o “eu”. Então, o que é esse “eu”? O que é esse centro? Quando você olha para uma roda, você sabe que ela tem um centro. Tem o centro da roda e têm os raios, a parte externa, a periferia. Então nós temos o centro e temos a periferia. Visualizando uma roda de bicicleta, você tem o centro, os raios e o aro.
O sentido de “alguém” presente aqui neste instante é exatamente a ideia desse centro. Em torno desse centro nós temos o raio, nós temos as experiências da vida e temos o aro, que é a própria vida. Então é assim que nós concebemos, idealizamos nossa vida humana, a partir de um centro.
Esse centro é o “eu”, é o ego, é a “pessoa”. Em torno dessa “pessoa” a vida está acontecendo – ao menos é assim que nós acreditamos. É assim que, portanto, estamos vivendo. Nós não podemos dizer que isso não é real. O que podemos dizer é que isso precisa ser investigado, porque a base da realidade disso, da verdade disso é que nisso consiste toda a confusão, todo o sofrimento, toda a desordem em nossas vidas. Então, isso é aquilo que se mostra, é aquilo que é nesse instante nossa vida – a vida dessa “pessoa”, a vida desse “mim”, a vida desse “eu”.
O que nós estamos vendo aqui juntos é a importância de termos uma aproximação para ver que isso que nós chamamos de “vida” ou “minha vida”, dentro desse desenho onde temos um centro em torno do qual a vida acontece, é algo que nós precisamos descartar, porque não tem qualquer verdade quando temos presente a Realidade Divina, quando temos presente a Realidade de Deus.
Então, veja: estamos lidando com o que é, com aquilo que se mostra sendo, com aquilo que parece ser. Isto é a verdade desse “eu”, onde temos essa particular vida. Mas existirá alguma outra coisa além disso? E é isso que estamos dizendo. Sim, certamente existe algo além disso, que é a verdadeira Vida Divina, que é a verdadeira Vida de Deus, não é a vida particular desse “eu”, desse centro, desse ego.
Então, como podemos ter uma aproximação disso? Aprendendo a olhar. Eu tenho dito que há uma diferença entre ver e olhar. Quando você vê algo, você sabe aquilo que está ali a partir de um conhecimento que você tem, que você traz. Quando você olha para uma pessoa, você sabe quem ela é. Esse saber quem ela é, esse conhecimento que você tem quando vê algo ou quando vê alguém se fundamenta em experiências passadas que você teve com ele ou com ela. Então, quando você está diante dele ou dela, você a vê. Uma coisa é ver, outra coisa é estar diante desse olhar.
Aqui nós precisamos descobrir uma vida onde haja um espaço completamente livre desse centro e dessa periferia. Então a Vida Divina, a Vida do seu Ser, a Vida de Deus, a vida possível para você é a Vida onde não existe mais esse centro e, portanto, não existe mais essa periferia. Como podemos nos aproximar desta Vida? Aprendendo a olhar.
Esse olhar é possível quando não existe esse centro que olha, que observa, que percebe. Quando não existe esse centro, não temos mais esse ver. Percebam a beleza disso. É possível reconhecer o rosto da pessoa, mas, ao mesmo tempo, não termos dela um conhecimento, uma experiência, uma memória que se assenta no passado, porque não temos esse centro.
Percebam a diferença. Olhar é completamente diferente de ver. Você está nesse “olhar”, nesse viver, nesse contato com o “outro” sem a separação, porque esse centro, que é o “eu”, o observador, aquele que traz do passado todas as experiências das quais viveu com ele ou ela, não está mais presente.
Aqui eu me refiro a essas experiências psicológicas. Você teve momentos agradáveis e desagradáveis, momentos que você teve prazer e, também, sofrimento com aquela pessoa, e isto deu uma formação para você. Essa formação é a formação desse centro; esse centro é o ego, é o “eu”.
Será possível uma vida livre desse centro, desse ego, uma vida completamente livre dessa relação com o “outro” com base em todas as experiências passadas? Nossas relações com as pessoas são relações de amor e ódio, de gostar e não gostar, de prazer e dor, confortáveis e desconfortáveis. Isso ocorre em razão desse ego, desse centro.
Enquanto houver esse centro, haverá essa periferia, haverá esse modo de aproximação onde aquilo que está se mostrando ali, que está sendo visto, em razão deste centro, está sendo avaliado, julgado, aceito, rejeitado. Então nossas relações humanas são relações conflituosas, porque existe essa separação, e esta separação está presente porque não há esse espaço.
Estamos aqui com você aprofundando isso. Olhar sem a imagem que eu faço sobre quem você é. A imagem que tenho sobre quem você é é uma ideia, uma conclusão, algo que vem de todas as experiências passadas nessa relação com você. Assim, nós não estamos nunca diante do novo, do inusitado, do desconhecido.
Uma vida livre de contradição é uma vida livre de sofrimento. Isso está presente quando não há mais essa separação, essa divisão, quando não há mais esse centro, quando o espaço é um espaço livre do “eu”, do ego. Então, todo o espaço presente na relação é um espaço pleno de um perfume novo, que é o perfume do Amor, da Compreensão, da Inteligência.
A questão aqui é: como podemos nos aproximar disso? Como se torna possível uma aproximação disso nesta vida? Descobrindo a Verdade sobre quem nós somos, quando nos tornamos cientes, quando nos tornamos conscientes de todo esse movimento, que é o movimento do “eu”, do ego, o que dá formação a esse centro e como desmontar essa mecânica.
“Se você me elogia, eu gosto de você”, “se você me aplaude, eu gosto de você”, “se você me reconhece, eu gosto de você”, mas “se você me critica, condena minha fala, rejeita minhas ideias, é contra as minhas opiniões, eu não gosto de você”. A mecânica desse centro, que é o “eu”, o ego, é estruturada exatamente assim. A formação desse centro, desse ego, é essa formação.
Estamos sempre guardando imagens das pessoas com quem nos relacionamos, portanto, estamos vivendo sempre, invariavelmente, no passado. Ao entrar em contato com você, eu vejo você, eu enxergo você a partir desse fundo, desse gostar e não gostar. Então nós temos esse mecanismo de formação de imagens nas relações. Essas imagens dão forma a esse centro.
Esse contato com você não é um contato livre do centro, é um contato preso a esse padrão de imagens. Então, a mente está presa na dualidade. Se a mente está presa na dualidade, o cérebro está preso nesse padrão de dualidade, ele está preso ao conflito, ele está preso a essas distorções que o pensamento produz. O que é esse pensamento? A memória.
Assim, quando digo que “eu amo você”, o que estou dizendo é que nesse momento me sinto confortável com a sua presença porque você acalenta, conforta, anima, aplaude, reconhece, aceita o meu ego, e vice-versa, então “você me ama e eu te amo”.
Observe, não existe nenhum espaço entre esse centro e essa periferia, esse “eu” e esse não “eu”. Não há espaço. Não esse espaço que é o Perfume da Graça, o Perfume do Amor, o Perfume da Inteligência. Há só esse espaço da contradição, da desconfiança, do medo, da desordem. Então nós temos aqui muito claramente porque o ser humano, porque nós em nossas relações não estamos em paz.
As pessoas perguntam: “Como encontrar a paz interior?” Não é possível haver paz enquanto esse espaço for o espaço da dualidade, da separatividade, desse “eu” e não “eu”. Então estamos propondo aqui para você rompermos com tudo isso para uma vida livre do ego e, portanto, onde há um espaço, mas sem o centro, há um espaço sem esse “eu” e o não “eu”.
A vida, repare, é de relação. Não podemos ter uma vida sem relações. Então o outro está presente, mas psicologicamente, internamente, dentro de nós mesmos nós não temos a imagem, porque não temos esse centro. Então o seu contato com a vida, o seu contato com as situações, o seu contato com os acontecimentos, o seu contato com o “outro”, o seu contato com você mesmo está acontecendo sem esse “mim”. Então, é apenas um olhar.
Tomar ciência desse corpo-mente sem uma identidade egoica, pessoal presente dentro dele, esse é o Real contato consigo mesmo, onde não existe esse “mim”. Tomar ciência de um pensamento surgindo, de uma emoção, de uma sensação, de uma percepção sem colocar esse “centro” tendo esse pensamento, sentimento, emoção, percepção, tendo isso como algo separado, vendo esse “eu” como a identidade que pode controlar, monitorar, gostar, não gostar dessa sensação, desse pensamento.
Notem, isso é o fim dessa dualidade, é o fim desse sentido de separação, é o fim dessa dualidade egoica, desse sentido de dualidade. Na Índia isso é reconhecido como Advaita, a Não separação, o fim do ego aqui e agora. Uma vida livre desse centro é uma vida livre do experimentador que forma imagens, que adquire imagens e que vive nesta base.