A coisa que realmente importa é a gente perceber essa Compreensão da Verdade, da morte da ilusão – e só o que pode morrer é a ilusão. Estamos tratando da morte da ilusão desse “eu”. Essa palavra “morte” é uma palavra que assusta, e muito, porque isso remete você ao fim de alguma coisa. Mas a verdade sobre isso é que nós nunca experimentamos a beleza do fim das coisas. O nosso movimento é sempre de adquirir, de possuir, de guardar, de acumular, de ter. Nós sempre temos a ideia de que quanto mais nós temos, porque adquirimos e agora acumulamos, mais seguros nós nos sentimos.
Aqui, tratamos do fim dessa memória psicológica, algo que eu tenho chamado de “complexidade de memória” ou “memória complexa”. Nós temos dois tipos de memória. Temos a memória simples, a memória da qual fazemos uso tecnicamente, tecnologicamente, funcionalmente, em nossa vida; e temos a memória complexa, que é a memória psicológica. Estar ofendido com alguém é ter guardado a lembrança dele ou dela, ele ou ela sendo alguém que não gosta de você, ele ou ela sendo alguém que maltratou você. Esse é um exemplo simples de memória complexa, de memória psicológica.
A nossa vida no “eu”, a nossa vida no ego é memória. Então, será que é possível realmente não carregar mais esse “eu” e, portanto, essa memória complexa, que é a memória dessa egoidentidade? Em outras palavras, seria interessante você viver sem se ofender, sem se magoar, sem se aborrecer, sem se entristecer com ninguém? Seria interessante para você não depender da apreciação nem do distrato do outro para ter uma posição sobre quem o outro é? Em outras palavras, seria interessante você viver sem imagem do outro?
Numa relação entre um casal, seria interessante sua relação com a esposa sem nunca ter dela qualquer psicológico desgosto, tristeza, raiva, irritação ou cobrança de que ela seja diferente de como ela é para você se sentir bem nessa relação? Seria interessante vivermos sem imagens das pessoas? Seria interessante você viver sem qualquer imagem de si mesmo, ou seja, não ter o que defender a respeito da avaliação que o outro faz de você, com o que pensam sobre você, com o que dizem sobre você, se gostam ou não gostam de você?
É isso que eu tenho chamado “a morte do eu”. Uma vida livre do sentido de alguém presente, dentro deste instante, nessa relação com o outro. Esse é o fim dessa memória complexa, dessa complexidade de memória que é a memória do “eu”. É essa memória do “eu” que tem crenças e descrenças. É essa memória do “eu” que usa expressões como “eu acho que”, “eu penso que”, “para mim isso não tem importância”. Estamos sempre com esse “mim”, com esse “eu”, com as nossas opiniões, com as nossas crenças, com as nossas descrenças. Tudo isso faz parte deste “eu”, da ilusão desta egoidentidade.
Uma coisa interessante sobre essa egoidentidade, também, é o fato de que ela se sente como sendo uma entidade presente que carrega uma individualidade bem peculiar, bem única, bem singular, o que não é verdade, porque tudo aquilo que você sente, pensa, acredita ou não acredita é algo comum a todos. Não existe esse sentido de individualidade separada, não existe um real sentido de alguém presente dentro dessa experiência. Tudo o que nós temos é um conjunto de memórias e uma habilidade inconsciente, mas muito presente nesse cérebro, de estar o tempo todo avaliando, julgando, comparando e formando novas imagens nas relações.
Então, nós estamos sempre dando continuidade ao “eu”, sempre dando continuidade ao ego, sempre dando continuidade a essa memória complexa, a esse sentido de alguém presente. E isso é conflito, isso é sofrimento. Essa qualidade de vida no “eu”, no ego, é ignorância. Então, quando a gente se aproxima desse trabalho sobre nós mesmos, dessa visão da Verdade sobre quem somos, nós nos deparamos com esse “eu”, com esse modo de nos relacionarmos com o momento, sempre a partir desse centro que está sempre formando imagens, sempre sustentando ideias, sempre tendo opiniões, sempre avaliando, e isso nos torna pessoas complexas, faz de nós pessoas tendo esse padrão de vida centrado no “eu”.
Ainda não descobrimos a beleza de permitir a experiência sem a mente. É a presença da mente que torna a experiência algo que guardamos, que registramos. Estamos sempre dando continuidade a esse passado registrado, a essa memória guardada, a essa imagem que o “eu” tem dele mesmo na relação com o outro. Estamos sempre dando continuidade a esse passado.
O que é essa morte do “eu”? O que é a morte do ego? É o fim do passado. Então, é este momento presente, onde a experiência perdeu a importância porque a mente não está. Acompanhe isso: a presença da Verdade d’Aquilo que é Você, não daquilo que se mostra sendo você: isso é o fim da mente presente, o que representa o fim da experiência. Então você está diante de um experimentar.
Ao se encontrar com alguém, o experimentar é tão Real, há uma Atenção tão plena, há esta Presença tão verdadeira, de plena Consciência, de plena Atenção, que a experiência perdeu a importância. O registro daquela experiência perdeu a importância, então o experimentar é significativo. É isso que eu tenho chamado a morte do “eu”, a morte do ego. Vale dizer aqui que isso é agora, sempre neste momento. Então, você está sempre diante de algo novo, porque não existe esse “eu”, não existe esse experimentador, não há nenhuma importância mais nessa experiência. Fica o experimentar, e nesse experimentar, o sentido do “eu” não está, o sentido do ego não se mostra, a experiência perdeu a importância.
O experimentar é significativo, o momento é significativo, este instante é único, não há o “eu”. Vocês têm momentos assim, onde o experimentar é significativo. A experiência perde a importância, porque o experimentador não tem qualquer importância ali, onde a mente não entra ali.
Quando você está diante de um pôr do sol ou caminhando numa trilha, há só o caminhar; ou olhar para a floresta, o cheiro das árvores, a brisa soprando, a mente não está, o experimentador não está, há só este instante. Isso é o experimentar. O ego não registra, não há o que ser registrado. Ele não pode tomar posse disso, o ego não tem qualquer interesse sexual, emocional, sentimental, nem intelectual nisso. Ele não pode adquirir esse momento. Nesse instante, não há “eu”. Esse é o momento da morte do ego, o momento do experimentar puro sem o experimentador, sem a mente, sem o próprio observador.
O observador em nós é aquele que observa e se separa para registrar. O observador em nós funciona como uma câmera fotográfica. A câmera está aqui e o objeto está lá, o que a câmera faz é se separar para registrar. É assim que o ego funciona. Esse “eu”, esse observador, esse experimentador está assim na sua vida.
Quando você se encontra com pessoas, você vive essa experiência e registra essas experiências para, ao encontrar aquela pessoa novamente, com esse fundo que você já traz, saber se posicionar naquela relação. Tudo isso ocorre em nossas relações uns com os outros porque o ego carrega medo, ele se sente inseguro e ele quer controlar a experiência. É por isso que ele entra para experimentar; ele entra para registrar. Então, ele é como uma câmera fotográfica que está sempre fotografando e registrando.
Quando você está em uma trilha, quando você está diante de um pôr do sol, sentado numa rocha, o mar, a luz do sol reluzindo sobre as águas, as ondas vêm com suas espumas e batem sobre aquelas rochas, há só o olhar, há só o momento, há só o experimentar. Não há registro, não existe essa câmera. Nesse instante, Algo está presente. Esse Algo não é o “eu”. Não há qualquer separação, porque não existe câmera, não existe registro, não existe observador. A coisa observada e aquele que observa são uma única Realidade. A rocha, aquele sentado na rocha, as espumas do mar voltando depois de terem batido nas rochas, só não é mais uma experiência, é um Real experimentar porque não fica registro, então o “eu” não está.
Uma vida na relação com o marido, com a esposa, com o patrão, com os empregados, no viver, momento a momento, sem o “eu”, sem a mente, sem o observador, sem a câmera, sem o registro, é uma vida livre. Isso é a morte do “eu”, isso é a morte do ego. Isso é o fim desta memória complexa. É o contato com a vida na totalidade dela.
Então, você pode fazer uso de sua memória de uma forma muito simples. Você pode até mesmo se lembrar que esteve naquela praia, que aquele momento ocorreu, mas ele não carrega mais um fundo de exigência, ele não é mais o momento que o ego sustenta, que o “eu” pôde capturar, que esse “mim” agora está dizendo: “É meu, tenho que voltar naquela praia de novo e sentir aquela mesma coisa.” Isso não acontece porque o ego não estava lá, não houve registro, foi só um momento que se foi.
A vida neste instante está acontecendo dessa forma. Você não precisa estar à beira de uma praia, diante de um pôr do sol. Você está diante de pessoas, numa relação com as pessoas, numa relação com esse momento, sem registro, sem essa memória complexa que o “eu” exige, que o “eu” busca para manter sua continuidade.
Então, o que é a Verdade do seu Ser? É esta presença desta Realidade, desta Pura Consciência, desta Real Consciência quando a mente não está – e aqui, é claro, me refiro a essa mente egoica –, quando o “eu” não está, quando o registro não fica, quando a experiência perde a importância. Então o seu Estado Natural de Ser se Revela. Isso é a aproximação da Meditação.
Coloquem isso em evidência agora, aqui, neste momento. Não precisa estar na beira de uma praia, não precisa estar diante de um pôr do sol, você está aqui e agora. Um pensamento surge, um sentimento, um rosto, uma pessoa, o que quer que esteja ocorrendo à sua volta. Esse “eu” é dispensável, esse registro é dispensável, esse movimento interno de inconsciência que lhe faz dar valor à experiência para poder capturar isso é desnecessário.
Então, aqui estamos nos aproximando da Verdade sobre a Meditação. E a Meditação está aqui e agora, não requer nada a não ser estar aqui e agora, sem o registro, sem o “eu”, sem o ego. Talvez você diga: “E como é isso?” Atenção. Plena Atenção sobre este momento. Nenhuma ambição, nenhum desejo de capturar, nenhuma intenção de levar isso para depois deste momento. Então não há registro.
Podemos passar uma vida inteira, mas uma vida no “eu” é uma vida em morte. Uma vida livre do “eu” é uma Real Vida na Verdade do Ser, na Verdade Divina, na Verdade de Deus. Isso é Autorrealização, isso é Realização de Deus. A memória simples está presente, mas a memória psicológica não está. A memória simples está presente, mas a memória do “eu” não está. E isso é o fim da ilusão, isso é o fim de toda forma de complicação, sofrimento, medo e desejo. Isso é o fim do “eu”, essa é a Liberdade do Ser, essa é a Liberdade de Deus. Isso é Realização de Deus, isso é Amor, isso é Felicidade. Aqui está a Verdade, aqui está o seu Ser.