Existe uma coisa bastante interessante nas relações humanas, em nossas relações uns com os outros. Me parece que uma das coisas mais difíceis dentro destas relações consiste na comunhão. Comunhão requer a presença de uma comunicação livre; nós não temos essa liberdade para a comunicação. Parece que nós não nos alcançamos quando falamos, quando dialogamos, quando nos aproximamos uns dos outros. Por que isso ocorre? Por que é que isso acontece?
Parece que compreendemos, sim, o significado verbal da palavra, mas nós escutamos através de uma ideia, de um conjunto de crenças, de opiniões, de conclusões aquelas palavras. Assim, estamos sempre atrás dessa cortina de ideias. Quando isso ocorre – e isso frequentemente ocorre –, não há comunicação. A ausência dessa comunicação é, naturalmente, a ausência da comunhão. Então, reparem como se torna importante termos uma nova aproximação aqui também, nesses encontros.
Aqui nós estamos fazendo uso de palavras bastante conhecidas de todos nós e, no entanto, o que eu tenho percebido é que as pessoas não conseguem compreender essas palavras porque elas escutam através dessa cortina de ideias que elas têm. Aqui fazemos uso de expressões como: “o Despertar da Consciência”, “Iluminação Espiritual”, “a Realização de Deus” – essas palavras e diversas outras que usamos aqui –, e a dificuldade que temos é acompanharmos essa leitura para que aconteça, dentro desse encontro, a verdade da comunicação e a comunhão se torne possível.
Se houver entre nós Real comunhão, de coração, até as palavras são dispensáveis. Reparem que coisa interessante: se houver, de verdade, uma comunhão, e essa comunhão está acontecendo em um nível diferente do intelecto, naturalmente, ela dispensa as palavras, ela dispensa a linguagem. Então, a verdadeira comunicação ocorre quando há comunhão.
Na vida, nós precisamos de comunhão; comunhão dentro da comunicação, comunhão na relação com o outro dentro de uma determinada atividade, comunhão no contato com o sentir, com o movimento da ação também acontecendo, com esse falar. Esse encontro de comunhão é essencial. Nós, como seres humanos, precisamos descobrir a Vida. A Vida é constatada quando há esse descobrimento. Nessa constatação existe um nível de imersão na vida, de imersão na existência, onde todo o sentido de separação entre esse “eu” e a própria vida se desfaz, desaparece, não está presente.
Então, se nós estamos aqui trabalhando essa questão da busca da verdade sobre quem nós somos, isso é o que se torna possível quando nós nos aproximamos de uma compreensão a partir dessa comunhão. Precisamos ter uma comunhão com aquilo que se passa agora, aqui. A fala é algo que requer comunhão, o sentir é algo que requer comunhão. A ação acontecendo ocorre de uma forma completa, única, Real – eu tenho chamado de Verdade da ação, de ação Real – quando há comunhão.
Nós estamos, internamente, em contradição. Nós vivemos, internamente, em conflito dentro de nós mesmos. Precisamos estudar isso, compreender isso, e isso se torna possível quando temos uma aproximação de nós mesmos, daquilo que se passa dentro de cada um de nós. Ter uma aproximação dessa requer que você aprenda a olhar, que aprenda a escutar, que aprenda a perceber a si mesmo; olhar, escutar a si mesmo é algo que se torna impossível quando o pensamento está presente, quando essa cortina de ideias está presente.
Então, reparem que coisa curiosa como nós funcionamos: nós temos ausência de comunicação porque interpretamos as palavras segundo as nossas crenças, opiniões, ideias e conclusões pessoais quando estamos em um diálogo ou quando estamos ouvindo, temos, neste momento, a dificuldade de acompanhar um texto como este, assim como temos a dificuldade de olhar para nós mesmos porque olhamos através de conceitos, de opiniões, de julgamentos, de crenças.
Eu quero tocar aqui com você na importância desse escutar a nós mesmos, de aprender a ter essa comunhão; uma comunhão que se torna possível quando você aprende a escutar, a olhar e a perceber aquilo que se passa dentro de você, sem essa cortina de ideias, sem essas conclusões, sem essas crenças, sem essas punições, sem esse autojulgamento, sem essa autoavaliação, sem essa autocrítica. Observem que é assim que, na maioria das vezes, nós olhamos para nós mesmos. Quando fazemos isso, há uma separação.
Compreender a verdade sobre você é algo que requer um olhar sem julgamento, sem avaliação, sem comparação, sem crítica, sem medo. Então nós temos a presença de uma Real comunhão, que se torna possível, também, agora, aqui se deixarmos de lado nossas crenças, nossas conclusões, nossas ideias, se deixarmos de lado o significado que temos dado a essa ou aquela palavra com base em nossos preconceitos, em nossos conceitos pré-formados. Então, o nosso encontro aqui tem como propósito essa autodescoberta.
Assim, nossa ênfase aqui, dentro dessa fala, será sobre essa questão da Atenção, da Verdade da Atenção Plena. Apenas quando há essa Atenção Plena se torna possível uma aproximação da revelação daquilo que se passa dentro de cada um de nós.
Se olharmos através dessa cortina de ideias, nós estaremos fazendo aquilo que uma boa parte das pessoas fazem na tentativa de melhorarem a si mesmas, de modificarem a si próprias através do esforço, da autodisciplina, dessa, assim chamada, “introspecção”. Reparem o que estamos colocando, acompanhem isso com calma.
Introspecção é uma forma de olhar para dentro de si mesmo através dessa cortina de ideias. As pessoas querem se livrar daquilo que elas não gostam de ver em si mesmas. Então, elas praticam, pela autodisciplina, pelo esforço, essa introspecção. Essa tentativa de mudança, de transformação com base no esforço, na disciplina, que tem por princípio já uma análise de si próprio, um olhar para si mesmo com base em ideias, pode criar uma mudança, sim, isso pode melhorar a pessoa, mas a pessoa melhorada ainda é a melhora do sentido de um “eu” presente, de uma identidade egoica presente.
Aqui nós estamos lhe propondo uma vida livre desse “eu”, desse ego, algo que se torna possível quando há essa inteira Verdade se revelando em razão dessa comunhão, e esta comunhão não vem pela introspecção. Essa comunhão nasce de uma forma muito natural quando estamos dando Atenção a nós mesmos, quando estamos nos tornando cientes de todo esse movimento interno de pensamento, de sentimento.
Esses pensamentos, esses sentimentos são aqueles em nós que nos impulsionam às ações. Nossas relações se assentam nestes pensamentos e sentimentos. Essas relações são ações que ocorrem tendo por princípio esses sentimentos, esses pensamentos. Tomar ciência desse movimento interno – essa simples tomada de consciência desse movimento, que é o movimento do “eu”, dessa pessoa, dessa identidade que se separa do outro para se relacionar – requer essa aproximação de comunhão, requer essa Atenção sobre si mesmo.
Portanto, nossa aproximação aqui é lhe mostrando a importância desse contato consigo mesmo, esse contato com aquilo que se passa dentro de você, um contato possível quando há essa Atenção. Não se trata de fazer algo com aquilo que você percebe, com esses sentimentos, pensamentos, com esse modelo de comportamento. Aqui se trata apenas de tomar ciência disso. A ciência disso rompe esse padrão de existência do “eu”, esse padrão de existência egoica, porque nesse momento ocorre essa comunhão: comunhão Real com o outro, comunhão Real com a Vida, comunhão Real em si mesmo. Então a contradição desaparece, o conflito desaparece, o medo desaparece, o sofrimento desaparece.
Percebam a beleza do que estamos colocando aqui para você. Repare, por exemplo, que o seu contato com o outro é um contato através de uma cortina de crenças, de ideias, de conclusões, de imagens que você tem sobre ele ou ela. Então, repare: não há verdade de comunhão nesse contato, porque aquilo que está presente é esse elemento, que é o “eu”, o ego, esse “mim”.
Há esse estado interno de contradição nesse encontro com o outro quando estamos dentro desse princípio de separação, de dualidade, então temos esse “eu” e esse “você”. Esse “você” é uma imagem que eu faço sobre quem você é, além de uma imagem que tenho sobre quem “eu” sou, e isso é contradição, isso é conflito, isso irá, naturalmente, produzir nessa relação algum nível de conflito, algum nível de problema, algum nível de medo, de violência, de desejo, de sofrimento.
Quando colocamos Atenção sobre esse movimento, que é o movimento do “eu”, essa comunhão com a Verdade daquilo que se mostra aqui, nesse instante, isso rompe com esse padrão, com esse modelo de identidade egoica. Isso é o fim dessa imagem, conclusões, crenças e opiniões sobre o outro. Isso é o fim dessa autoimagem em contradição, em conflito, carregada de desejos e medos dentro desse “mim”.
Percebam que isso é algo que se torna possível quando nós colocamos essa Atenção, esse olhar para esse movimento interno. Apenas o olhar nos mostra isso completamente se revelando, e quando isso tudo se revela, nesta própria revelação, isso se desfaz. Não temos que fazer algo com isso que está sendo visto, não temos que mudar isso que está sendo visto, não temos que coordenar isso que está sendo visto ou percebido.
Esse próprio olhar, esse próprio observar sem escolha, sem esse elemento, que é o “eu”, o ego, sem essa cortina de conclusões do que é certo ou errado, é o fim para isso, é o fim para essa condição, que é a condição do “eu”, do ego, porque nesse momento temos presente esse escutar a nós mesmos, esse perceber a nós mesmos, esse estar ciente desse “mim”. A ciência disso é o fim para essa condição automática, inconsciente, repetitiva, para esse movimento que, na realidade, é um movimento que já vem do passado, que já vem dessas crenças, conclusões. Ter uma aproximação de si mesmo desta forma não é introspecção, não é autoanálise, não é autodisciplina, é Atenção.
A ciência da Atenção sobre todo o movimento do “eu”, do “mim”, do ego, a ciência dessa cortina de ideias, dessas crenças e conclusões é o fim para tudo isso. Então, essa é a forma da Real aproximação da Verdadeira Meditação, da Real Meditação. Naturalmente, essa Real Meditação é Autoconhecimento.
Assim, aqui temos como propósito essa aproximação; esta aproximação lhe coloca nessa nova visão da Vida, nessa nova visão de Ser, nessa nova visão do mundo, do outro, numa Real visão da Verdade deste Ser que somos. Então, a Verdade da Atenção sobre esse movimento do “eu” é o fim para esse movimento; isso é Autoconhecimento, isso é a Verdade da Real Meditação – compreendendo que aqui Meditação e Autoconhecimento são palavras com um significado bem peculiar.