A pergunta é: “Como se livrar do sofrimento ou como vencer o sofrimento?” Estamos aqui diante uma pergunta, ou de duas perguntas, bastante intrigantes. Nós precisamos compreender a verdade do sofrimento. Qual é a estrutura? Qual é a natureza? Qual é a base real do sofrimento? É interessante essa nossa tentativa de se ver livre do sofrimento. É interessante porque queremos ficar livres disso sem antes compreender o que é o sofrimento.
O ponto aqui é que não podemos ter uma aproximação do que é o sofrimento, qual a sua estrutura, sua natureza e sua base sem antes nos aproximarmos de uma compreensão da verdade daquele que sofre. Quem é esse que sofre? Nós não perguntamos. Nós perguntamos como “eu” posso me livrar do sofrimento, mas não perguntamos o que é esse “eu”. Não temos interesse em investigar a natureza do “eu”, ou seja, a natureza daquele que sofre. A não compreensão da verdade sobre esse “eu” que sofre nos impossibilita a compreensão da verdade sobre o sofrimento.
Nós vivemos, por exemplo, como criaturas separadas umas das outras, com ideias, conceitos, opiniões, particulares visões sobre esse assunto, sobre aquele outro assunto. Isso é algo muito particular em cada um de nós. Isso é algo que nos separa. Nós estamos separados como criaturas humanas. Como criaturas humanas nós vivemos separados uns dos outros, separados da vida e separados de nós mesmos.
Nós não sabemos o que é o pensamento presente para esse “eu” que está separado do pensamento – ou pelo menos ele se vê como uma entidade separada do pensamento. Por exemplo, nós temos essa ideia “estou pensando”, então tem esse “eu”, o pensador, separado desse pensamento, tem esse “eu” separado dele ou dela, tem esse “eu” separado da vida. Essa separação, essa divisão, a presença desse “eu” que se vê separado de si mesmo, daquilo que surge como pensamentos, emoções, sentimentos, esse “eu” que diz “sinto, penso”, esse “eu” que diz “estou vendo”, esse “eu” que diz “eu e você”, “eu e ele”, “eu e a vida”, esse “eu” é o sentido de uma identidade presente se separando.
Aqui nós temos o elemento principal dessa questão da estrutura, natureza e base de todo o sofrimento humano: é o elemento “eu”. “Eu tenho minha religião, você tem a sua religião. Eu tenho a minha ideia, você tem a sua ideia. Estamos separados”: nesta separação há, naturalmente, o conflito. “Eu sou cristão, você é budista, ele é mulçumano”, “Eu sou católico, você é evangélico, ele é espírita”, “Eu acredito nisso, você acredita naquilo e eles acreditam em outra coisa”, nós estamos, assim, separados, e nesta separação há, naturalmente, conflito, divergência, atrito, sofrimento.
Não sabemos lidar com o pensamento, porque temos esse “eu” que não sabe o que é o pensamento e o pensamento lhe aflige. Repare que nós temos uma mente inquieta, tagarela, há um movimento de pensamento que não sabemos como ele funciona em nós. Do ponto de vista de sentimentos em nós, sentimos, mas não sabemos o que são os sentimentos, não sabemos lidar com os sentimentos, não sabemos lidar com os pensamentos, não sabemos lidar com as emoções, não sabemos lidar com o outro. Não percebemos que esse “outro” separado desse “mim” é algo que está sustentando, nesta divisão, essa ou aquela outra forma de conflito e, portanto, de sofrimento.
Assim, qual é a natureza do sofrimento? É a não compreensão da verdade desse “eu” que se separa da vida, que se separa do outro politicamente, religiosamente, filosoficamente, psicologicamente, existencialmente. Esse “eu” em “mim”, esse “mim” que é o “eu” autocentrado numa posição egocêntrica na vida, no viver, é angústia, é ansiedade, é depressão, é confusão mental, é desordem psicológica, emocional, é desordem religiosa, é desordem filosófica, é desordem política. Tudo isso é o sofrimento do homem, é o sofrimento humano, é esse “meu sofrimento”.
Então, qual é a estrutura, qual é base, qual é a natureza do sofrimento? É o sofredor, é o sentido de “alguém” presente que ao se deparar com a vida como ela é se depara com a vida a partir de ideias, de formulações ideológicas, formulações psicológicas, formulações religiosas. Então, os nossos conceitos e preconceitos fazem com que sejamos criaturas separatistas, vivendo uma vida particular egocentrada e, portanto, em sofrimento. Psicologicamente, estamos sobrecarregados de pensamentos nessa inquietude de um cérebro que está programado para se mover de uma forma automática, inconsciente, em um movimento de insanidade, lidando com os pensamentos, com as emoções e os sentimentos de uma forma caótica.
Então, vivemos no futuro, psicologicamente falando, e essa vivência no futuro em nós representa esse peso de ansiedade. Vivemos no passado e essa vida no passado é a ilusão de “alguém” aqui, nesse instante, presente nesse momento com uma história da qual quer se livrar. Esse sofrimento é a depressão. Esse momento presente não é compreendido como ele é porque há esse peso, há todo esse movimento de inquietude quanto ao que fazer, o que não fazer, como lidar com o “outro”, como lidar com esse “mim”, como lidar comigo mesmo, com esse senso de um “eu”. A condição nesse presente momento é de estresse. Então temos a ansiedade, temos a depressão, temos o estresse, temos essa ou aquela forma de sofrimento em razão da presença desse que sofre, que é o “eu”.
Esse sentido de uma identidade presente, que é o “eu”, é a raiz, é a questão básica, é a estrutura e a própria natureza do sofrimento. Ter uma aproximação, um olhar novo para esse movimento da vida requer uma mente livre, uma mente descondicionada, porque é assim que nós estamos vivendo nossas vidas: temos uma mente condicionada. O cérebro é parte dessa mente condicionada, nosso intelecto está condicionado, nosso modo de avaliar, de julgar, de comparar, de aceitar ou rejeitar ocorre em nós de uma forma bastante restrita, limitada, condicionada em razão desse conjunto de ideias, de avaliações preconcebidas, de conceitos adquiridos dentro dessa cultura, dentro dessa sociedade, dentro desse mundo.
Então, o nosso cérebro está condicionado para se mover dentro desse padrão de condicionamento; um cérebro condicionado, uma mente condicionada, um modo de se aproximar do “outro”, de se aproximar dos desafios da vida completamente equivocado. As situações adversas, as situações difíceis, as situações complicadas são, na realidade, situações desafiadoras. Elas são difíceis, elas são adversas, elas são complicadas em razão desse cérebro condicionado. Essa inabilidade de lidar com a experiência do momento presente se configura em um desafio para uma mente condicionada, para um cérebro condicionado. Então, atender a esse desafio dentro dessa limitação, nessa ausência da Real Inteligência, da Real Consciência se configura em sofrimento, se mostra numa condição de vida e de existência conflituosa, aflitiva.
Então, notem, para a pergunta “Como se livrar do sofrimento ou como vencer o sofrimento?”, a resposta está na compreensão da natureza do “eu”, do ego. Sem a base Real, que é Autoconhecimento, sem a singular e única Verdade da Real Meditação de uma forma vivencial, aqui e agora, é algo impossível. Enquanto o sentido de um “eu” que se vê separado da vida, que se vê separado da Existência, enquanto o sentido de um “eu” presente permanecer se vendo como uma entidade separada de si mesmo, sendo esse “eu”, o pensador, separado dos pensamentos, esse que sente separado dos seus próprios sentimentos, esse que se vê na emoção separado das suas emoções, esse que se vê como sendo o “eu” separado do outro, enquanto isso estiver presente, haverá sofrimento.
Enquanto não houver a compreensão desse elemento, que é o elemento separatista que sustenta esse sentido de dualidade, a dualidade estará presente. Nessa dualidade psicológica, nesse sentido de uma identidade separada do “outro”, separada da vida, separada dessas representações internas de pensamentos, sentimentos, emoções, sensações, percepções, enquanto isso estiver presente, o sofrimento estará presente; então, a nossa vida, do início ao fim, será sempre uma vida de problemas e, portanto, de sofrimento.
Aqui eu quero lhe convidar a uma vida livre do “eu”, do ego e, portanto, uma vida livre de sofrimento. A Realidade do seu Ser, que é a Realidade de Deus, não carrega sofrimento. Não se trata de vencer o sofrimento, não se trata de se livrar de sofrimento, se trata de compreender a ilusão desse “eu”. Isso é o fim para esse que sofre e, portanto, isso é a verdade sobre o fim para o sofrimento. A verdade sobre vencer o sofrimento, a verdade sobre se livrar do sofrimento é a verdade de ir além desse “eu”, de soltar essa ilusão desse senso de uma identidade separada, o que significa o fim do ego, o que se constitui como o fim do “eu”. Alguns chamam isso de o Despertar Espiritual, a Realização de Deus.
Então, nós estamos trabalhando exatamente isso aqui com você, lhe mostrando a Verdade da Revelação do seu próprio Ser. Tomando ciência desse “eu”, há o fim para essa ilusão, e o fim dessa ilusão desse senso de um “eu” que sofre é que está a Liberdade de não sofrer, a Liberdade para essa questão do sofrimento.