Participante: Como lidar com os desejos da mente e do corpo?
Marcos Gualberto: Se tentar brigar com a mente e o corpo em razão dos desejos, você vai entrar numa luta muito complicada. Ao longo da vida, alguns de nós adquirimos fixações psicológicas, as quais, de certa forma, ficam ligadas ao corpo, e é isso que, talvez, você acaba de chamar de “desejo”, não é?
Compreenda uma coisa: o corpo e a mente podem adquirir, ao longo da vida, hábitos, que depois passam a se tornar desejos psicológicos com fixações físicas, mas a sua Natureza Verdadeira não é o corpo, não é a mente. Você pode partir para uma luta contra o corpo e a mente, mas ela ainda será dessa egoidentidade, então será uma luta muito séria, muito complicada.
Na razão em que você se aproxima do trabalho de autoconhecimento, de observação desse movimento da mente e do corpo para os chamados “desejos”, você começa a descobrir algo dentro de si muito maior que essa sensação de desejo que a mente e o corpo provocam.
Essa é a forma legítima de lidar com o corpo e com a mente. Então, não é brigando com eles, mas tomando consciência do que está por trás dessas fixações, desses desejos psicológicos e dessas motivações físicas. Quando faz isso, você coloca a Consciência como uma testemunha desse comportamento egoico, desse comportamento indisciplinado do corpo e da mente. Essa é a forma correta de lidar com os caprichos do ego ligados a desejos do corpo e da mente.
Você não tenta amarrar um animal selvagem, você conquista a amizade e simpatia dele. Você oferece um pouquinho de comida para ele, se aproxima dele amigavelmente e não luta contra ele, porque assim não funciona.
As pessoas tentam se livrar de dependências psicológicas brigando com elas. Você precisa de um poder maior do que esse desejo para ir além do desejo. O desejo de se livrar do desejo ainda é o conflito se reforçando, se restabelecendo, se fortalecendo.
Então, aqui a minha recomendação é que você primeiro relaxe e descubra o que significa a motivação por detrás disso. Não é analisar, é tomar ciência da presença do que o motiva psicologicamente, fisicamente, a fazer o que faz; é descobrir o Poder do Silêncio, da Consciência, por detrás do corpo e da mente.
A Consciência pode trazer ordem ao corpo e à mente, mas a mente egoica não vai fazer isso, assim como você não vai domar o cavalo amarrando-o na estaca. Você pode até amarrá-lo num poste, mas ele não estará domado. Você tem que conquistar o animal, tem que dominá-lo e, para isso, tem que se aproximar dele, não pode ser agressivo com ele, porque ele não vai ser domado assim, não é assim que o domador faz com os animais.
O corpo e a mente estão aí há milênios, e tudo o que eles fazem é criar confusão. Olhar de perto como a mente e o corpo funcionam é a maneira de descobrir como quebrar essas motivações do ego.
Isso não vale só para o desejo, isso vale para o medo também. Como você lida com o medo dentro de você? Da mesma forma que você deve aprender a lidar com o desejo. Você tem que se aproximar disso, tomar consciência da presença desse estado e ver o que a mente está criando. Você vai olhar de perto e vai descobrir que tem muita imaginação flutuando aí, muita imaginação!
Então, como a gente se aproxima do medo? Observando. Você se aproxima observando e, assim, quebra o poder do medo, porque se desidentifica dele, se desidentifica do desejo, se desidentifica do corpo quando toma ciência da presença do que está aí.
Sabe o que o leva ao desejo? A não alegria de ser. Você não está na Alegria de Ser. Se você estivesse na Alegria do próprio Ser, não estaria queimando por um desejo. Quando você está Feliz em Si, em seu próprio Ser, não tem nada que supere Isso, não tem nenhum desejo que o arraste. Se você está cônscio da Realidade do seu próprio Ser, não existe medo que seja real.
Você está sempre sendo arrastado pela mente egoica, pela imaginação, pela busca de sensações, pela insatisfação, pela dor, pela tristeza, por um fundo de angústia. Quando existe uma Satisfação interna aí, real, não há desejo. Então, você tem que observar as histórias que o medo está produzindo, que o desejo está produzindo; as histórias ligadas a esse desejo e esse medo. Está tudo dentro da sua cabeça!
Quando falamos de inclinações de desejo ou de medo, estamos falando de identificação com o corpo. Desidentifique-se do corpo, desidentifique-se da mente, descubra a Alegria de Ser, de puramente Ser; descubra a Alegria da Meditação, de permanecer como Consciência, de permanecer em sua Natureza Essencial, e, assim, o desejo e o medo desaparecem, eles terminam sendo consumidos, porque eles têm base e fixação numa identidade falsa, que está infeliz, em conflito, em sofrimento, perturbada, em angústia.
Se você está em profunda Paz, livre de pensamentos, que espécie de pensamento vai surgir como um desejo? Se você está livre de pensamentos, que pensamento vai surgir causando-lhe medo? Isso tudo é imaginação! Então, você se livra do desejo e do medo livrando-se de si mesmo.
Todo esse comportamento é da mente; é ela que está produzindo isso. Ela está produzindo o seu mundo, criando estados em você de tristeza, de angústia, de insatisfação, de desejo, falando da necessidade de ter isso, ter aquilo, ter aquele…
Você tem que se lembrar de si mesmo como Consciência e não como corpo. Se continuar se vendo como o corpo, você terá muitos problemas, e eles jamais terminarão, porque tudo o que a mente sabe fazer é criar problemas, e o corpo está dentro dessas limitações do que a mente representa. Então, enquanto houver essa identificação com o corpo e a mente, você jamais estará livre do medo e do desejo.
As coisas são importantes enquanto são importantes. Quando valoriza muito uma coisa é porque você é muito carente daquilo, e essa valorização é uma fixação, um apego, um conflito. Você precisa encontrar a Liberdade de Ser, de viver sem coisas.
Quando eu digo “coisas”, eu incluo “pessoas”. Pessoas são as coisas mais preciosas que o ego tem. Percebe o que eu estou dizendo? Você tem um carro, mas ele não é tão precioso quanto o seu filho. Você não gosta de ouvir isso, mas é assim. Só que do ponto de vista da Consciência, da Realidade, o carro e o filho estão na mesma categoria – nenhum dos dois é seu e você não tem controle sobre nenhum deles. Eu só dei dois exemplos, mas você pode estender muito isso.
A única coisa que importa é a consciência da Verdade sobre quem Você é. Isso não exclui o carro e o filho, não exclui a família, não exclui nada à sua volta, muito pelo contrário: isso é algo profundamente inclusivo. Mas não é inclusivo no sentido de uma entidade pessoal, particular, carente e necessitada daquele objeto para ser feliz, para se preencher, para se satisfazer, para se realizar.