O problema de lidar com a questão da morte é basicamente o problema de lidar com a questão de perder. Você tem medo de aceitar a morte porque não aceita perder. É típico da mente egoica juntar. A sensação, no ego, é que quanto mais você tem, mais você é. É por isso que você fica se cercando de coisas, vivendo sempre na crença de possuir, porque quanto mais você possui, maior é o seu senso de identidade, o seu senso de vida.
Você não faz isso porque tem medo da morte, porque a morte, em si, você não sabe o que representa. Você quer se cercar de coisas porque quer “estar vivo” nessa experiência de ter coisas, de possuir. Então, você não tem medo do desconhecido, não tem medo de morrer; você tem medo de deixar o que tem. O seu medo é de perder, de ficar sem o que você tem, porque o que você tem, ou acredita ter, lhe confere vida.
Se você morrer, você vai deixar sua mulher para outro marido, os filhos para outro pai, vai deixar a casa, aquele seu objeto… você vai deixar muitas coisas! Sua vida psicológica está se sustentando em cima desses bens; você está apegado a eles.
Você diz “o medo do desconhecido gera pânico”. Não! Você não pode ter medo do que desconhece. O seu medo é de largar o que você conhece. Por exemplo, se eu disser para você “ali tem uma caverna e nós vamos entrar nela, mas tem uma coisa: não vamos poder sair. Se entrarmos, não sairemos mais”, você dirá para mim “não, eu tenho medo do desconhecido!”, mas isso não é verdade! Você tem medo de não ter mais o conhecido. Você não sabe o que tem lá dentro da caverna, mas sabe o que tem do lado de cá.
Então, escute isso: o seu medo é o apego a essa vida. O medo da morte não é da morte, em si; é o apego a essa vida. Os Sábios são unânimes quanto a isso: você precisa “morrer” antes da morte, ou seja, você precisa “perder a vida” antes de perder o corpo, antes de o coração parar de bater, de o cérebro parar de ter oxigênio, e isso significa que você precisa se livrar dessa “sua vida”. Se isso é feito, não há problema com a morte, porque ela é o desconhecido. Se você realiza Isso agora, você já está no Desconhecido, aí acaba o medo da morte.
Por que um Ser Realizado não tem medo de morrer? Porque ele já “morreu”! Não é simples? Se ele já “morreu”, está em contato com o Desconhecido, com o Inominável, o que está fora do tempo, fora da mente. Se você perguntar para mim o que é essa Vida, eu não sei. Agora, se você perguntar dessa “sua vidinha”, eu estou vendo o que ela é: confusão absoluta. Dessa eu sei falar, porque é o que eu vejo à minha volta.
Quando você descobre o que é essa Vida fora da mente, não fica ninguém para trazer um relatório, para achar bom ou achar ruim, para dizer que lá é assim ou é assado, que o Desconhecido é assado, cozido ou malpassado. Se é algo desconhecido, vai permanecer desconhecido.
Ninguém sabe o que é, de verdade, estar vivo ou morto. O que significa “alguém vivo” ou “alguém morto”? Isso é sempre do ponto de vista do que a mente vai descrever, sempre dentro do ponto de vista do conhecido, do tempo e do espaço. A Vida é o que se apresenta aqui, fora do tempo, mas, no tempo, a mente cria uma história e nessa história tem personagens. Então, ela diz: “Ah, eu sinto falta de fulano”.
Alguns personagens estão próximos, outras distantes, outros morreram e outros estão nascendo. Isso é só uma historinha, um sonho construído pelo pensamento. É dessa vida que você quer que eu fale? Dessa, eu sei falar. Agora, da Bliss, da Benção, da Graça, do Estado Natural, que é Sat-Chit-Ananda, que é Ser, Consciência, Felicidade, eu não sei falar, não. Eu sei viver Isso! Se você vive Isso, você não sabe falar Disso. Curiosamente, tem gente que não vive Isso e fala Disso, como se estivesse dizendo alguma verdade.
A Vida é o Mistério, é quando não há mais o senso do “eu”. Por isso que, quando alguém disse a Jesus “Mestre, eu também tenho um morto para enterrar, que é o meu pai”, ele disse “deixa que os outros mortos enterrem aquele morto. Teu caso é comigo. Vem e segue-me”. Ou seja, na visão de Jesus, tanto os que estavam sendo sepultados como os que estavam sepultando e chorando em volta do defunto estavam mortos.
Você está apegado a essa condição de “vida de morto” que você chama de “vida”, e é isso que você não quer deixar. A vida egoica é essa vida, uma vida em confusão, em conflito, em apego, em desejo, em medo. Então, o apego a essa vida é o apego a essa confusão que você chama de “vida real”.
Viver em Deus é viver fora do senso do “eu”. É esse “eu” que representa o seu mundo, um mundo específico, de sua imaginação, de sua criação, do seu desejo, do seu apego, do seu medo. Fora desse senso do “eu”, você está diante do Inominável, diante do Desconhecido. Não há medo aí, porque não há “eu”, não há mundo. É a Vida! Não é uma vida para você ter coisas, para viver experiências, para amar ou odiar, para ser feliz ou infeliz, para conquistar ou perder. O objetivo da Vida é a Vida! Não é o objetivo da Vida “se estar vivo”, porque se hoje se está vivo, amanhã se morre. O objetivo da Vida é a Vida!