O que é, afinal, estar aqui?

O que é, afinal, estar aqui?

A noção geral é que você está presente, aqui, como uma “pessoa” e, como uma “pessoa”, você carrega os seus medos. Tanto a procura do prazer quanto a fuga do medo pressupõem a “pessoa” presente. Basicamente, medo é a tentativa de rejeitar a dor, e o desejo é a tentativa de encontrar o prazer – isso sempre do ponto de vista da “pessoa”. Mas, qual é o ponto de vista da “pessoa”? A ilusão é a presença da “pessoa”, mas como não há nenhuma “pessoa”, não há prazer ou dor, não há desejo ou medo.

O pensamento transforma a experiência da dor em uma história. Contudo, a dor não está no passado nem no futuro – você não pode pegar a dor do passado ou do futuro e trazer para esse momento. Então, repare: você nunca está experimentando, como uma “pessoa”, a dor do passado. Tudo que você tem agora é só memória, que é uma história de dor; não é a dor. Você pode trazer a história da dor e, com isso, construir uma “pessoa” nesse presente momento, com um trauma, com uma culpa, com uma dor… mas isso está só no pensamento. A dor do passado não chega nesse momento, porém a lembrança sim, o que, na verdade, é só o pensamento imaginando “alguém” presente aqui. A dor do futuro também não chega aqui, mas o pensamento produz a ilusão de uma dor presente aqui, com base em uma imaginação.

A verdade da Liberação é a constatação de que isso é uma grande fraude, uma grande mentira, uma grande ilusão. Não há “pessoa” nesse momento. Não tem pessoa aí! Não tem “pessoa” para desfrutar o prazer ou para sofrer a dor, só tem a fantasia, a imaginação, aquilo que o pensamento cria para esse “você” que você acredita ser… “Alguém” no desejo ou no medo – “no desejo” significa nessa procura do prazer e “no medo”, nessa fuga da dor.

Tudo aí é imaginação! Tudo que foge dessa realidade do presente momento está acontecendo na imaginação. Na imaginação, existe uma dor presente, mas não é a dor do passado; existe uma apreensão com relação ao futuro, mas não é o futuro.

Participante: Mestre, a diferença entre a dor e o sofrimento é que a dor é algo factual e o sofrimento é a história que o pensamento cria em cima disso?

Mestre Gualberto: A dor não acontece para “alguém”. Para “alguém”, acontece a história da dor. A dor dá validade à presença de um suposto “alguém” – “suposto” porque ele não está ali, e isso é, basicamente, sofrimento. A mente egoica é um paciente imaginário buscando tratamento, buscando cura. É por isso que você não pode realizar essa Liberação, porque você não existe para ser liberado. A Liberação é saber isso, que não há “alguém” para a Liberação. Isso é Liberação!

Você não trata com o passado nem com o futuro; você trata e lida somente com a imaginação, que é o pensamento. Portanto, a dor não está no futuro, não está no passado; o prazer não está no futuro, não está no passado. O movimento da mente egoica é o movimento do passado e do futuro – o presente é o passado e o futuro imaginados como memória e desejo, sonho. E onde está você? Onde está o tempo, se tudo é pensamento? Não é simples isso?

Então, a sua história não é para ser contada, ela só pode ser imaginada através da memória, e os seus sonhos, que são os seus desejos, são só a imaginação de um futuro que não é real, porque você não é real, você não estará lá!

Então, aí temos a resposta. Como é estar aqui? A resposta é uma outra pergunta: como se pode estar?

Participante: Eu fechei os olhos aqui, agora, e eu não sinto nada… É um nada! Totalmente nada!

Mestre Gualberto: Mas você está neste “nada”! Você está no tempo! Você está transformando isso em conhecimento, que é tempo, que é memória. Você está perdendo exatamente a essência da fala. A fala é para Você, não é para mente; a fala é para sua Natureza Essencial, que está fora do tempo, fora da mente, fora do conhecido. Mas, o que a mente faz? A mente é gananciosa! Ela quer transformar isso num conhecimento para depois se recordar, para depois buscar e usar isso como algo prático, algo dela.

O segredo, ao estar diante de um Jnani, de um Acordado, é não estar. Só é possível isso quando a sua atenção é tão profunda, tão clara, que não fica memória, resíduo, nenhuma cicatriz, nenhuma marca dessa expressão, seja ela visual ou auditiva. Aí, Você está, porque Você está aqui quando “você” não está. Quando “você” está, a memória, o conhecimento, as anotações estão… A mente está! Quando “você” não está – que é quando Você, de fato, está – não tem “alguém”, não há “pessoa”. Isso é Meditação!

Esse é um assunto que requer sua atenção, só que essa atenção é sem “você”; não é uma parte de você, não é a memória ocupada, o intelecto ocupado, o sentimento ocupado… É Você! O seu olhar, o seu ouvir, o seu sentir, a totalidade do seu ser nisso!

Em sua Natureza Verdadeira, Essencial, Real, não há dor, não há prazer. Ela não está no tempo! No tempo está a memória, a imaginação. A memória é o passado e a imaginação é o futuro. Aí está a “pessoa”, mas, aqui, a “pessoa” nunca está!

O que fica? O que permanece? O que está antes, durante e depois? Aquilo onde o antes, o durante e o depois aparecem; onde o passado, o presente e o futuro aparecem.

Isso significa que a sua história, que é só memória, que representa a dor sendo lembrada ou o prazer sendo desejado (passado e futuro) não é real! Real é onde isso aparece, onde isso acontece. Real é Aquilo que permanece, Aquilo que fica, mas não é aquilo que fica no tempo, é Aquilo que é atemporal. É um “ficar sem ficar”, um “permanecer sem permanecer”. Como é lindo ver que não há “pessoa”!

Você tem que solicitar o seu bloquinho de notas para trazer a “pessoa” de volta, com todas as informações que ela adquiriu, as quais estão só na memória, registradas numa história imaginária de “alguém” que aprendeu algo, que adquiriu algo. Aprender significa pegar, adquirir. Não se pode aprender Isso! Não dá! A Verdade é muito viva, algo imponderável, intocável, inatingível!

Vocês acham que eu trato da Verdade com vocês? Eu trato do fim da ilusão! Da Verdade mesmo eu não trato, Ela aflora! Ela é Você como seu Ser, mas não é verbalizada – não é possível ser verbalizada com palavras que o pensamento construiu. A Verdade, não! O fim dessa ilusão, sim! Eu trato com você do fim dessa ilusão, o fim do conhecido. O conhecido é a ilusão, é aquilo que forma o tempo como memória, como imaginação, e a sua vida é só memória, imaginação e conhecimento. Essa, assim chamada, “sua vida” é assim: uma vida pessoal. Mas não tem “pessoa”! Então, a sua vida é uma ilusão!

Não tem “alguém” aqui! “Você” não está assentando aí – tem o assentar, mas não “você”! É quando “você” não está aí que é Agora, e Agora só há Beatitude, Amor, Silêncio, Paz, Liberdade, Felicidade, porque não há desejo. Felicidade é ausência de desejo, ausência de medo, ausência de prazer e dor.

Agosto de 2016
Cabedelo – PB, Brasil