Nós temos algo bastante paradoxal para investigarmos dentro desse encontro. Tenho observado que, quando as pessoas se aproximam, a intenção delas é sair do sofrimento, o que pode parecer bastante natural a princípio. Quando chegam nesse encontro, elas escutam que a causa do sofrimento é a ilusão de uma entidade presente. Então, quando descobrem que a causa do sofrimento é a ilusão de uma entidade presente, esse suposto “eu”, o ego, coloca na cabeça que agora é preciso se livrar desse “eu”, desse ego. É isso o que eu tenho observado. Parece razoável, agora, vocês buscarem essa libertação. Então, vocês querem se libertar do ego, já que ele é a causa do sofrimento.
E aqui é que nós nos deparamos com um assunto muito delicado: você não pode se libertar do ego! Você quer se libertar do ego porque está sofrendo, mas esse sofrimento é o próprio ego, e, agora, ele está querendo se livrar dele mesmo. Por isso que o assunto da Liberação, ou Realização, ou Iluminação, é um assunto muito delicado.
Geralmente, a pessoa tem uma aproximação disso de uma forma pessoal, e, então, a pessoa quer se livrar da “pessoa”, o ego quer se livrar do ego, com a mente dualista, com o sentido da dualidade presente. A questão aqui é: todo esse movimento só fortalece o sentido de uma entidade presente. Essa não é a resposta, esse não é o caminho. É por isso que você pode passar uma vida inteira ouvindo falas, adquirindo informações sobre Isso [Iluminação], tendo experiências, também, em razão de alguma prática de meditação, mas, no final, isso não resulta em nada, porque a mente jamais vai se livrar da mente; o ego jamais vai se livrar do ego.
Todo esse movimento é da ilusão, pela ilusão, em prol da ilusão. Esse movimento é a busca, uma grande armadilha que a mente egoica criou. Ela se disfarça e cai em sua própria armadilha, fingindo que quer fugir da armadilha. Parece querer se libertar, mas o movimento dela é um movimento contrário a isso. Assim, o movimento da busca apenas fortalece o buscador.
Estamos vivendo um momento no Brasil, em particular, em que há muitos buscadores, mas são buscadores cegos. O buscador cego é aquele que caminha na escuridão. Quando um cego caminha, ele esbarra em muitos objetos se não tiver um guia; se existirem buracos, ele pode cair neles com facilidade. A busca é algo assim: um caminhar na escuridão, uma estrada cheia de buracos e sem nenhuma luz sobre ela. Esse é o movimento do “eu”, do ego, na busca.
Então, ser um buscador não significa nada. O buscador é um cego! A questão é que todos estão adorando essa coisa da busca, entretendo-se com ela – ler livros, assistir a vídeos, etc., são apenas entretenimentos. Isso é ser cego e andar na escuridão, numa estrada cheia de buracos. Você não precisa da busca! Você precisa desse trabalho de autoinvestigação, de auto-observação. Assim, não se trata de procurar por Isso em falas, vídeos, livros, ou ficar andando de guru em guru, o que também é um entretenimento. Vocês estão buscando distrações. O trabalho é outro completamente diferente. O trabalho está na rendição, na entrega do “eu”, por meio dessa autoinvestigação, que é essa auto-observação, numa real devoção a Deus, à Verdade, que é a Real entrega ao Guru. Então, o Guru fora, nesse momento, e somente nesse momento, é o mesmo Guru dentro de você. Então, não existe fora ou dentro.
Assim, essa autoinvestigação é a observação desse movimento da mente egoica, ocupada com seus desejos, predileções, escolhas, contrariedades, raiva, medo, voltada para a realização de prazeres, busca de entretenimentos, diversões, enfim, com toda essa disposição para a vida mundana e indisciplinada. Observe que a mente egoica está com a sua energia toda voltada para a exterioridade, numa completa desatenção, interessada em coisas estúpidas, como estar engajado em movimentos de reatividade social, política…
Essa autoinvestigação é o trabalho, e não se trata de buscar o fim do “eu”, alimentando mais ainda o “eu” com aquilo que ele deseja, como espiritualidade, conhecimento, experiências, enfim, todo esse tipo de coisa. Aqui, trata-se de olhar para isso, para esse impulso, esse movimento viciado de ir para fora, de buscar preenchimento e realizações externas, de se identificar com pensamentos, com aquilo que é lixo.
Se você for sério quanto a isso, você aprenderá a olhar para esse sentido de “alguém” presente, esse “mim”, esse “eu”, com toda a estupidez que ele deseja, e abrirá mão disso. Não importa a quantidade de conhecimento espiritual que você tenha se a sua mente está povoada de pensamentos estúpidos; se você está cedendo, constantemente, aos caprichos dessa estupidez do pensamento. Se é assim, esse não é o seu momento ainda.
Tudo isso que eu acabei de colocar para você é a própria ação da Graça… É o terreno sendo preparado. Se a sua casa já está limpa e arrumada, então você já pode receber um hóspede, assim como um terreno preparado pode receber uma planta capaz de florescer. Essa “casa” pode receber um hóspede, a visitação do Despertar, e esse é o germinar e o florescer dessa Verdade. Assim sendo, você deixa a busca, abandona o sentido de “buscador” e olha para si mesmo, para toda essa desordem interna, essa bagunça, para colocar ordem na “casa” e preparar o “terreno”. Então, a Verdade, que já está presente, pode florescer. Falar de uma Verdade presente sem essa autoinvestigação, entrega, rendição, é uma grande ilusão. Isso é ser um buscador cego.