Ser é algo que você não aprende; você desperta para Isso! Ficar sozinho é fundamental! Ficar sozinho não é ficar isolado, mas é não se perder na experiência, no contato com o mundo do lado de fora. Esse contato é inevitável, mas se perder nele é evitável. Por que nesse encontro eu estou convidando você a ficar sozinho, o que pode parecer extremo? Não falar, não pensar… Na verdade, quando eu digo “não falar” e “não pensar”, estou dizendo: “Não expresse o seu contato – esse contato pessoal, individual, da ‘pessoa’ que você acredita ser – com o outro, com o mundo do lado de fora”. Não expresse palavras e nem expresse pensamentos. Se você faz isso, sua atenção fica voltada para dentro. Você não tem como se perder quando observa todo o movimento interno (o que acontece aí dentro), sem se identificar com ele. Não tem como você se perder.
Você se perde somente quando salta para fora, para o mundo externo, voltando, mais uma vez, ao mesmo esquema, modelo, padrão, dessa identidade separada. Quando faz isso, você começa a fazer as considerações de “uma pessoa” para “pessoas”. Isso é como uma árvore que ainda não cresceu. A gente coloca um gradil ao redor de uma árvore que queremos proteger de animaizinhos que querem comê-la, ou, num lugar que venta muito, para protegê-la de um vento muito forte, que pode arrancá-la pela raiz. Você dá toda a proteção para aquela plantinha poder crescer, protegendo-a do vento, do frio demasiado, dos outros animais… Você dá a essa plantinha, a essa árvore, a condição para ela crescer.
Quando você observa o movimento interno, o que se passa aí dentro; quando observa os pensamentos, as respostas internas diante de algo; quando você observa suas reações internas, esse desejo de falar com o outro, de trocar ideias, de trocar experiências, de exigir ou de cobrar; quando você só observa, a atenção nessa observação começa a revelar todo esse padrão e tudo isso começa a vir à tona, começa a aparecer! Você não analisa isso, apenas observa! Você não compara isso, não diz que isso está certo ou errado, que não deveria ser assim, que deveria ser de outra forma… Você não faz isso! Você apenas observa essa energia que, antes, estava na expressão e, agora, está na observação. Antes ela estava no sentimento, agora está na observação.
O pensamento vem e é observado; o sentimento vem e é observado (o mau humor, o bom humor, o mal-estar, o bem-estar; um pouco de tristeza, de melancolia; uma contrariedade, uma espécie de revolta…). Há uma raiva porque “o copo está fora do lugar”; “Ele não lavou o prato dele”; “Ela deixou essa pilha de pratos em cima da pia”; “Ela é a ‘minha esposa’ (‘minha’ – algum direito que ‘eu’ tenho)”… Então, essa contrariedade é observada. Você vê todo esse movimento interno surgindo, toda essa revolta, essa contrariedade, e olha para isso. Isso quer tomar seu corpo, seu sistema nervoso, e você apenas observa. Quando você observa, isso não consegue se expressar, não tem energia para se expressar, porque sua energia de atenção está toda voltada para esse movimento, que é o movimento do “mim”, com “seus” direitos, “suas” razões, “seus” sentimentos, “suas” sensações e conclusões; com “sua” história!
Acompanham isso?
É o que vamos fazer nesses dias aqui: não expressar! Você vai lá e faz, se puder fazer. Se não puder fazer, fica só o desejo que não pode ser realizado, e você solta. Por exemplo: deixaram a luz acesa. Você se levanta, vai lá e apaga; não fica, internamente, nessa história de cobrança. Não se identifique com a história de “culpados”. Compreendem o que quero dizer? Dá para acompanhar isso? “Quem foi esse miserável que deixou a luz acessa?”; “Que menina chata! Ela gosta de deixar a luz acesa”. Aí você fica nessas historinhas: “Eu não gosto dela”; “Ela vai ver!”; “O que eu vou fazer amanhã?”; “Vou me vingar, vou dar meu jeito”… É bem assim que acontece: historinha! Isso é um desperdício enorme de energia, dessa energia de Consciência, de Presença, de atenção!
Eu não conheço isso há muito tempo, porque eu não levo desaforo para casa. Eu não guardo historinhas. Você guarda historinhas: “Você me paga”; “Vai se ver comigo”… Assim, você vive cheio de inimigos e, também, cheio de amigos, porque você fica devendo favores para quem faz alguma coisa boa para você. Eu não guardo. Você me faz alguma coisa boa e, para mim, você “morre” no momento em que acabou de fazer. Eu não lhe devo nada! Não tem necessidade de carregar amigos ou inimigos aí. Não é lindo isso? Compreendem o que quero dizer?
Quando você está livre de amigos e de inimigos, tudo é Amor. Seus olhos cintilam esse brilho, porque não tem futuro e você não prometeu a vingança para si mesmo – a vingança de “alguém”. Não tem passado também, porque ninguém lhe fez nada, de modo que, agora, você não está devendo alguma coisa para alguém. Eu estou falando que Ser não se aprende! A arte de Ser não se aprende! Você trabalha Isso, agora, nesse momento. Trabalha essa “coisa” de viver sem imagem – a imagem do outro como uma boa pessoa ou uma pessoa ruim.
Compreendem? Eu estou sozinho, sempre sozinho. Ninguém pode me frustrar, me abandonar, tornar-se meu inimigo porque antes era meu amigo. Por quê? Porque eu estou sozinho. Eu não estou falando de mim. Estou falando de você! Trabalhe isso agora, aqui; deixe tudo no lugar, não se meta com “pessoas”! Não se meta nessa de “ser pessoa”, pois, fazendo isso, você se mete com “pessoas”, e, aí, você está numa ilusão, na prisão do tempo.
Essa pequena árvore não pode crescer, se não foram dados proteção e cuidado a ela. Essa Presença, que Você É, tem que ser acolhida nessa Consciência e nessa Liberdade de não se identificar, de não se perder e não se confundir com coisas, lugares e pessoas. Então, Você permanece em sua singularidade, em sua Liberdade, em sua Beleza. Ser não se aprende! É um reconhecimento de que só tem Você em todo o universo, no meio de todas as formas, de todos os nomes, de todas as coisas, pessoas, lugares, objetos… Só tem Você!
Tudo aparece como no sonho. Quando você para de se identificar aqui, no seu estado de vigília, à noite, quando tem sonhos, você observa que também está desidentificado. É diretamente proporcional: quanto mais identificado no estado de vigília, mais identificado no sonho. Identificação você já sabe o que é – estar perdido na experiência do momento, como o experimentador, como o fazedor.
Nesses dias, eu li algo que achei simples, sobre Muruganar, que foi um discípulo direto de Ramana. Ele escreveu, falando de Ramana: “O nosso amado, o nosso Senhor, o nosso Mestre, nosso Bhagavan, nos libertou da ilusão de que nós somos os autores das coisas, de que nós somos os fazedores”. Isso é de uma extrema beleza! O Guru, o Mestre, em sua Graça, liberta você dessa ilusão – a ilusão de ser “alguém” no mundo. Você faz isso agora! Não é uma coisa impossível! Você não aprende a Ser; você assume Ser! Não é uma coisa impossível, mas você tem que desaprender a ser uma “pessoa”. Ouviram isso? Você não aprende a Ser, mas você desaprende a ser uma “pessoa”, e você faz isso agora!
Como você desaprende a reagir (ter reatividade, ser reativo), a viver em amizade com a inconsciência, agindo dentro de um condicionamento, de uma resposta mecânica inconsciente, estando desatento? Comece pela observação. Observe como você olha para as pessoas e o que sente quando olha para ela ou ele. Você sente algum vínculo? Esse vínculo é uma imagem. Você gosta dessa pessoa? É uma imagem. Você não gosta? É uma imagem. Ela é chata? É uma imagem. Ela é boazinha? É uma imagem. “Gosto dela”, ou “ela é horrível, detesto”; imagem! “Não quero nem saber de você”, ou “quero tanto ficar com você”; imagem também!
Essa imagem é uma vinculação. Você está vincado! Sabe o que é vincado? Você pega uma roupa faz um vinco e ali tem uma marca. “Eu gosto tanto dela”… Quando você se lembra de alguém e sente isso, é um vinco. “Que pessoa detestável”, é um vinco. Isso se desaprende, viu? Você não aprende a Ser, mas desaprende a “ser pessoal”, a “ser gente”. Ser Deus é uma Graça, mas ser gente não é coisa muito boa. Porém, você desaprende. Tem que desaprender a ser uma “pessoa”. Quando começa esse trabalho? Agora! Não tem pessoas nessa sala, não tem gente aqui. Você quer continuar no jogo? Se quiser continuar no jogo, você vai fazer muitos amigos, e inimigos também; vai adorar ser amado, detestar ser odiado e vai odiar em troca. É o jogo.
Você quer continuar no jogo? Quer continuar preocupado com o que pensam sobre você, com o que falam de você? Você quer continuar no jogo ou quer aprender a olhar, a ouvir, a sentir o outro? A interioridade dele, não a “pessoa”! No meu caso, hoje, como eu não tenho interesse em “pessoas”, eu fico com o ver, o sentir, o ouvir… com O que Eu Sou – a interioridade delas! Então, elas só me fazem bem porque Eu sou o bem das minhas relações, dos meus relacionamentos! Eu sou a Felicidade dos meus relacionamentos! Fora do jogo, você não depende. Fora do jogo, não tem você na dependência, na carência, na necessidade, no medo, no prejuízo, na preocupação, no desejo.